Relatos de experiências desenvolvidas entre 2010 e 2014 no Distrito Federal e Entorno


Projeto Luz do Saber - Alfabetização com inclusão digital


Fortalecer raízes e criar asas
em círculos de aprendizagem


Relatos de experiências desenvolvidas entre
2010 e 2014 no Distrito Federal e Entorno







Agradecimentos

Esta experiência não teria sido possível sem a força do voluntariado, composta pelos sócios de diversos núcleos da União do Vegetal do Distrito Federal. Pessoas que atenderam ao chamado de “fazer valer o bem”, doando seu tempo e seus talentos a esta iniciativa. A lista de todas elas encontra-se na contracapa desta publicação. Manifestamos nossa gratidão a quem, pela sua determinação e persistência, apostou na proposta de implantar o Luz do Saber no Distrito Federal, entre as quais: Angela Martins e Márcio Santiago, respectivamente ex e atual presidentes da Casa da União; Lauréti Lopes Mascarin, ex-Coordenadora Nacional do Luz do Saber; José Araújo e Everaldo Azevedo, ex-representante e ex-presidente do Núcleo Luz do Oriente, e Ednaldo Azevedo, presidente do Ninho dos Artistas, por terem criado um ambiente de possibilidades para a concretização da proposta; Carmen Palet e Carla Franco, da Coordenação Regional da Beneficência da UDV, pelo empenho em manter viva a chama do Luz do Saber no DF; Edison Saraiva e Cláudio Sarkis, pelo encorajamento visionário e o apoio financeiro; Graziene Moreira, pelas valiosas dicas sobre o funcionamento do Luz do Saber em Goiânia; Maria Madalena Torres, do Cepafre, e William Bonfim, da Recid, pelas ideias inovadoras e a capacidade de trocas solidárias; à gráfica Semear, à Universidade de Brasília, à empresa Tramity e ao gabinete da Deputada Federal, Perpétua Almeida, pelos diversos apoios que recebemos.       




Brasília, dezembro de 2014.



Sumário

Por que Luz do Saber
Propósito deste processo alfabetizador
Retrato das reflexões sobre nossa prática
O que é o Luz do Saber
Parceiros dessa história
A contribuição de cada um
Estágios da proposta: gestar, planejar, realizar e refletir
Alfabetização em São Sebastião, decorrência desta iniciativa
A “descoberta” de Águas Lindas
Funcionamento do laboratório
Dinâmica do Projeto
Acompanhando o desenvolvimento dos estudantes
Aulas especiais: compartilhando talentos
Formações no software Luz do Saber
Contatos com o Cepafre e a Recid
Grupo de planejamento, registro e sistematização
O foco da sistematização realizada
Pergunta 1
Pergunta 2
Pergunta 3
Conclusão. Conclusão?
Anexo 1. Cartas Pedagógicas
Anexo 2. Exemplo de planejamento das aulas






Por que Luz do Saber
Que opções existem em nossa sociedade para pessoas que não conseguem pegar um ônibus, pois não sabem ler? Ou que ficam envergonhadas, porque seus documentos pessoais não possuem assinatura, mas a marca do polegar? E o que dizer daqueles que, mesmo reconhecendo as letras e assinando o seu próprio nome, não sabem lidar com um telefone celular ou fazer um depósito no caixa eletrônico do banco?
Vivemos na chamada sociedade da informação, de fluxo rápido e de interpretações instantâneas. Ao mesmo tempo, esta é uma sociedade excludente, onde quem não se adapta é (des)tratado. O analfabetismo ainda é uma dura realidade para milhões de pessoas. Pessoas que, por não saberem ler e escrever, são excluídas do desenvolvimento social e econômico de nosso país. Vivendo em ambientes que desvalorizam seus saberes e seu poder pessoal, elas permanecem presas a um círculo vicioso que deteriora sua qualidade de vida e a de suas famílias.
O Projeto Luz do Saber pretende romper esses dois empecilhos: o analfabetismo e a exclusão digital. O Projeto ensina a ler e escrever com auxílio do computador. Mas não só isso. Por meio de forte interação social, promove a valorização pessoal e o acesso a direitos de cidadania. Ou seja, permite que as pessoas tenham novas chances de ver e interpretar o mundo, modificando-o.  Assim, o Luz do Saber se configura como instrumento de inclusão e oportunidade para a discussão coletiva da realidade, com vislumbre de modificá-la.

Propósito deste processo alfabetizador
O propósito da aprendizagem retratada nesta publicação está expresso no título “Fortalecer raízes e criar asas em círculos de aprendizagem”.  
Fortalecer raízes, porque acreditamos que participar de processos de alfabetização fortalece a identidade pessoal e comunitária. Auxilia as pessoas a se autoanalisarem, perguntando-se:
Quem sou eu? De onde venho?
Que importância tem a minha vida para mim e para os outros?
Com isso, a alfabetização contribui para aumentar a autoestima tanto de educandos quanto de educadores. Fortalece sua identidade, tornando as pessoas mais capazes de reconhecer e valorizar os recursos que estão ao seu alcance no seu próprio ambiente, na cultura e na comunidade em que convivem.
Criar asas, porque a alfabetização, ampliando o conhecimento das pessoas sobre a sua realidade, permite-lhes mais autonomia para fazer escolhas. Isso dá maior segurança para pegar um ônibus até a possibilidade de encontrar um emprego melhor... Ou auxiliar os filhos nas lições de casa... Ou contribuir com a modificação das condições do bairro... Ou muito mais... O tamanho do voo depende do tamanho das asas criadas.
Em círculos de aprendizagem, porque acreditamos que em um processo educativo todos – educadores e educandos – aprendemos e enriquecemo-nos mutuamente por meio da interação contínua. Uns aprendem ensinando, outros ensinam aprendendo. Constituímos uma comunidade aprendente, conforme defendia o educador Paulo Freire, em quem o Luz do Saber se inspira.


Retrato das reflexões sobre nossa prática
Esta publicação retrata os resultados do Projeto Luz do Saber em Águas Lindas de Goiás, no entorno do Distrito Federal, entre os anos de 2012 e 2014. Foi realizada com base nas reflexões de um grupo de educadores voluntários, que se debruçou sobre as ações e os resultados obtidos em dois ciclos de alfabetização propiciados pela parceria entre as associações Casa da União (de Brasília) e Ninho dos Artistas, e com apoio financeiro da empresa Bioon.  
Para conhecer esta experiência em mais detalhes, acesse <http://luzdosaberaguaslindas.blogspot.com.br/>
Como uma árvore que possui raízes, o processo em Águas Lindas se deu a partir de movimentos ocorridos antes, abrangendo o período de 2010 a 2014, que são resgatados em uma Linha do Tempo. A publicação registra também os resultados de outra experiência de alfabetização, realizada na zona rural de São Sebastião-DF em 2013, surgido como resultado das formações e reflexões propiciadas pelo Projeto do Luz do Saber em Águas Lindas de Goiás. Raízes e frutos estão presentes, portanto. Mas a reflexão refere-se apenas ao processo ocorrido em Águas Lindas.
Desejamos que as lições produzidas nesta sistematização inspirem os sonhos e as práticas daqueles que acreditam na educação. E que sirvam para alimentar suas próprias iniciativas, sem necessidade de “reinventar a roda”, mas fazendo girá-la melhor. Acreditamos que as experiências já vividas – e principalmente as reflexões sobre elas – têm potencial para transformar realidades. Portanto, boa leitura!  


O que é o Luz do Saber
O Luz do Saber é uma metodologia de alfabetização de jovens e adultos que se baseia em um software livre[1] com o mesmo nome, em um manual pedagógico, em aulas na frente do computador e em atividades de lápis e papel. Para utilizá-los se faz necessário realizar uma formação específica e criar um “ambiente” alfabetizador.
Esse ambiente é constituído por:
·         Computador onde o software possa ser instalado ou conectado à internet.
·         E uma “mesa alfabetizadora”, na qual os estudantes podem exercitar a coordenação motora e interagir em grupo.
As aulas intercalam momentos de trabalho individual, em frente ao computador, com momentos de interação e socialização das aprendizagens.
O trabalho é facilitado por uma pessoa que tenha feito a formação no software e que possa acompanhar os estudantes em sua trajetória pelas 19 aulas previstas no primeiro módulo do curso.
Segundo esta proposta educacional, o computador e o software alfabetizador são ferramentas; o professor/facilitador tem papel orientador e mediador; e o aluno é um colaborador ativo de sua própria aprendizagem.

Para saber mais sobre o software Luz do Saber, acesse: http://www.luzdosaber.seduc.ce.gov.br/

Sobre o software
O software Luz do Saber surgiu em 2007 de uma proposta da Casa da União-Brasília/CEBUDV, apoiada pela Casa Brasil, da Presidência da República, do Ministério da Educação e da Secretaria da Educação do Estado do Ceará. O programa, feito em plataforma livre, está disponível para as escolas da rede pública de educação[2], ONGs, associações comunitárias, movimentos populares, e demais instituições que atendem a esse público-alvo.
Trata-se de um software de autoria, ou seja, que permite a produção de novas aulas, com a alteração das palavras geradoras, a introdução de novos textos e imagens para adaptar ao contexto local e ao universo cultural de seus alunos. Baseia-se no conceito dos círculos de cultura do educador Paulo Freire e considera as contribuições das educadoras Emília Ferreiro e Ana Teberosky acerca do processo de aquisição do código linguístico.
O Luz do Saber está dividido em sete menus interdependentes: “Começar”, “Ler”; “Escrever”; “Karaokê”; “Favoritos”; “Internet”; “Professor”. O primeiro é composto pela “Apresentação do computador”, “Círculos de Cultura” e “Aprendendo usar o computador”, composto por 20 atividades que visam ao estímulo através de jogos, ao conhecimento dos fonemas e grafemas que compõem o nome do aluno e, paralelamente, ao desenvolvimento das competências necessárias ao uso de mouse e do teclado. O módulo “Ler”, com base no “Método Paulo Freire” de alfabetização, visa potencializar o processo inicial de alfabetização.
O software conta com a proposta de 19 aulas que possuem várias atividades cada. Ao todo, estas aulas contêm 213 atividades pedagógicas para demonstração. O programa é compatível com os sistemas operacionais Linux e Windows.




Parceiros dessa história

Associação Beneficente Casa da União - Brasília
Essa entidade civil sem fins lucrativos integra o Centro Espírita Beneficente União do Vegetal (CEBUDV), uma religião que comunga ritualisticamente o chá conhecido pelo nome de Hoasca. Fundada em 10 de fevereiro de 1982, a Casa da União - Brasília tem caráter filantrópico, assistencial, educacional e cultural. Desenvolve suas atividades no Distrito Federal, voltadas à promoção social de parcelas marginalizadas da população, sem distinção de sexo, cor, raça, nacionalidade, crença religiosa ou classe social.
Entre seus afiliados, a entidade conta com profissionais da rede pública de educação e também com pessoas vinculadas à educação popular e à cultura digital. Alguns desses profissionais formularam a proposta do Projeto Luz do Saber em Águas Lindas de Goiás e fizeram a formação de educadores para os processos de alfabetização.
Dois núcleos da União do Vegetal do Distrito Federal, por meio de seus Departamentos de Beneficência, desenvolveram laboratórios do Luz do Saber no período entre 2012 e 2014. Voluntários do Núcleo Luz do Oriente iniciaram a proposta do Luz do Saber em Águas Lindas de Goiás. Inspirados nas formações e reflexões resultantes desse processo, integrantes do Núcleo Estrela Matutina iniciaram um laboratório em 2013.
Casa da União está no Facebook. Curta o perfil e acesse o site para mais informações:
www. casadauniao.org.br

Associação Castelinho Cultural Ninho dos Artistas (ACULNA)
O Ninho dos Artistas é uma Organização Não Governamental que desenvolve atividades de formação profissional, cultural e esportiva em Águas Lindas de Goiás. Formalizada apenas em 2000, o Ninho dos Artistas vem desenvolvendo ações de educação e cultura há mais de 30 anos junto à comunidade daquela região.
Ali funcionou a primeira escolinha da então comunidade rural do Descoberto, antes mesmo da existência da cidade. No espaço de 60 mil m2 realizam-se cursos profissionalizantes, de caráter beneficente: marcenaria, serralheria, cerâmica, teatro, confecção de brinquedos, informática.
 O Ninho dos Artistas enfatiza ações que desenvolvam diferentes habilidades artesanais, preparando as pessoas, principalmente os jovens e adultos, para o mercado de trabalho. No local existe um amplo espaço multiuso, dotado de biblioteca e computadores, onde foram realizadas as atividades do Luz do Saber.
Ninho dos Artistas está no Facebook. Curta o perfil e conheça o blog: http://ninhodosatistas.blogspot.com.br/

Bioon
Esta empresa de Brasília comercializa uma ampla diversidade de produtos, desde alimentos, cosméticos, fitoterápicos, produtos de limpeza. Todos com procedência garantida e seguindo critérios que valorizam o cuidado com o meio ambiente e com as pessoas. Seu apoio a esta iniciativa deve-se à crença da empresa de que o negócio deve favorecer o social.
A Bioon Ecomercado está no Facebook. Curta o perfil e acesse o site para mais informações:
www.bioon.com.br
O diagrama abaixo mostra as relações que se estabeleceram entre os parceiros para a realização dos laboratórios de São Sebastião e Águas Lindas. As áreas pontilhadas se referem a iniciativas, que embora relacionadas ao projeto, não são objeto desta sistematização.






A contribuição de cada um


Nas ações que são objeto desta sistematização...






Linha do Tempo
Estágios da proposta: gestar, planejar, realizar e refletir

Na condição de coautora do software Luz do Saber, a Casa da União – Brasília sempre teve interesse em testar a eficácia da metodologia proposta. A intenção era realizar uma iniciativa, refletir sobre ela e propor caminhos para ampliar a escala do trabalho. As condições propícias para isso surgiram em 2010. Acompanhe a trajetória da proposta.

2010
·         A meta da diretoria da Associação Beneficente Casa da União durante o triênio 2009-2012 era implantar pelo menos um laboratório do Luz do Saber no Distrito Federal.
·         Foram realizados contatos com a Associação Amigos do Vôlei visando implantar laboratórios do Luz do Saber em espaços onde aquela entidade realiza suas atividades.
·         Em setembro de 2010 realizou-se a primeira formação do Luz do Saber na Vila Olímpica Rei Pelé, em Samambaia - DF. Participaram 27 pessoas, gente de diversos núcleos do CEBUDV disposta a trabalhar no projeto de forma voluntária. Mas a parceria com a Associação Amigos do Vôlei não chegou a se efetivar.

2011
·         Durante apresentação sobre as ações da Casa da União no Núcleo Luz do Oriente, na chamada Casa da União Itinerante, a Presidência do Núcleo manifestou interesse em implantar um laboratório experimental do Luz do Saber.
·         Um grupo de voluntários se reuniu em torno de proposta e no fim do ano ocorreu uma oficina para formação de educadores do Projeto na Associação Ninho dos Artistas, em Águas Lindas de Goiás. 

2012
·         No início desse ano formalizou-se a proposta desse Projeto e durante o primeiro semestre ocorreram negociações para implantá-lo.
·         Em agosto desse ano teve início a primeira turma do Luz do Saber em Águas Lindas.
·         Entre agosto e dezembro foram realizados eventos de formação, com destaque para as trocas realizadas com o Centro Paulo Freire – Cepafre, para aprimoramento da proposta pedagógica, e mais uma formação sobre o software Luz do Saber. Dessas formações participam integrantes do Núcleo Estrela Matutina.

2013
·         Em fevereiro, integrantes do Departamento de Beneficência do Núcleo Estrela Matutina elaboraram projeto de implantação de um laboratório do Luz do Saber na zona rural de São Sebastião, que foi realizado de março a outubro.
·         Em março, a Prefeitura de Águas Lindas manifestou interesse em desenvolver novos laboratórios do projeto no município, porém as conversações não foram adiante.
·         Em abril, a primeira fase do projeto Luz do Saber em Águas Lindas foi concluída. Teve início a fase de planejamento da segunda turma.
·         Em agosto começou a segunda turma do laboratório de Águas Lindas.

2014
·         Em março houve a conclusão da segunda turma do Luz do Saber em Águas Lindas.
·         De abril a julho realizaram-se quatro reuniões de sistematização da experiência de Águas Lindas, das quais participaram alguns dos educadores voluntários da primeira e da segunda turmas.
·         Entre novembro e dezembro, foi elaborada a publicação do projeto.


Alfabetização em São Sebastião, decorrência desta iniciativa

A participação de pessoas do Núcleo Estrela Matutina nas formações realizadas pelo Projeto geraram uma iniciativa de alfabetização na zona rural de São Sebastião-DF. As aulas tiveram início em fevereiro de 2013 na varanda de uma casa margeada pelo córrego Tororó, conduzidas uma vez por semana pelas monitoras Maria Paula Vasconcelos, Ana Cristina Borges e Elza Lasse.
Inicialmente participaram seis alunos em aulas que ocorriam apenas uma vez por semana, às quintas-feiras, com duração de quatro horas. Este trabalho foi realizado de forma voluntária. Posteriormente a Monitoria da Casa da União passou a arcar com uma ajuda de custo à educadora Ana Cristina Borges, para que assumisse de forma permanente o trabalho.
No ano de 2014 priorizou-se acompanhar os mesmos alunos, estimulando na prática da leitura por meio de literatura apropriada para estudo domiciliar. Em outubro desse ano, articulações realizadas com a equipe docente do Colégio CESAS, de Brasília, permitiu que esses alunos fizessem uma prova de avaliação para serem inseridos na rede pública de ensino. O nível obtido por eles nesta avaliação foi de 5º ano do Ensino Fundamental, o que para alunos representou um grande salto. Três deles deram prosseguimento aos estudos por meio da modalidade de educação a distância, mais adaptada à realidade rural.

“A experiência de inserção dos alunos na rede pública de ensino oferece ao professor do Programa Luz do Saber um sentimento de alegria como de um bebê que dá os primeiro passos. É uma beneficência valiosa, mas que exige um nível de acompanhamento muito aproximado.”
Maria Paula Vasconcelos Taunay,
educadora do Luz do Saber em Tororó
 



A “descoberta” de Águas Lindas

Águas Lindas é a quinta cidade mais populosa do Estado de Goiás, com cerca de 170 mil habitantes. Situa-se na bacia do rio Descoberto, no entorno do Distrito Federal. Grande parte de sua população desloca-se diariamente para trabalhar nas cidades satélites do DF, como Ceilândia, Taguatinga, ou mesmo no Plano Piloto.
Embora o município possua escolas da rede pública municipal e estadual e tenha também uma universidade, o índice de analfabetismo é um dos mais altos do Estado de Goiás. Em 2004 este índice era de 10%. Quando se leva em conta o analfabetismo funcional[3], esse índice sobe para 24%, principalmente na população adulta.
O Ninho dos Artistas se situa no bairro Guaíra, onde não há escolas que oferecem cursos de Educação de Jovens e Adultos. Por isso, cursar EJA é custoso, principalmente devido ao perfil dos estudantes. A maioria passa horas em ônibus lotados, tanto para ir quanto para voltar do trabalho. Para eles, estudar à noite torna-se quase impossível se houver necessidade de mais deslocamentos. Uma pesquisa no bairro identificou um grupo de pessoas interessadas em ler e escrever.  Todas morando nas ruas próximas ao Ninho dos Artistas ou cujos filhos participavam de atividades socioculturais e esportivas nesta ONG.

 “Alguns dizem que Águas Lindas é muito longe. Mas eu digo que longe é onde não existe nem Coca-cola e nem cearense.”
Auricélio Timbó, professor voluntário que participou das
duas fases do Luz do Saber em Águas Lindas,
mesmo morando em Águas Claras - DF, a 49 km de distância,
e usando transporte público.  


Funcionamento do laboratório
No período compreendido entre 2012 e 2014, o Projeto Luz do Saber em Águas Lindas - GO realizou duas turmas de alfabetização de jovens e adultos. A primeira teve início em agosto de 2012 e concluiu em maio de 2013. Matricularam-se 21 pessoas e 13 concluíram o curso alfabetizadas (61% de aproveitamento). A segunda fase teve início em agosto de 2013 e concluiu em março de 2014 com 15 matriculados e nove alfabetizados (60%).
As aulas ocorreram no espaço multiuso do Ninho dos Artistas, que foi convertido em ambiente alfabetizador graças à parceria entre as duas instituições. Além dos computadores, mesas e cadeiras, o ambiente alfabetizador é criado para acolher e estimular a leitura e a escrita. Isso envolve, por exemplo, colocar nomes em todos os objetos, decorar as paredes com letras e números, e estabelecer espaços de socialização, como o mural dos aniversariantes do mês. 
As aulas eram realizadas de segunda a quinta-feira, das 19h30 às 21h30. A carga horária semanal foi definida em função da realidade dos estudantes, pois grande parte deles trabalha em locais distantes da moradia. As sextas-feiras livres atenderam a um duplo propósito: um tempo para a equipe pedagógica planejar as atividades da semana seguinte e também uma noite para os alunos cuidarem de suas necessidades pessoais. 

 “Vejo que a flexibilidade quanto à presença tem que ser aplicada, porque a realidade dos alunos é de uma rotina muito dura.”
Fábio Queiroz,
educador voluntário da segunda turma
do Luz do Saber em Águas Lindas





Dinâmica do Projeto
Há diversas experiências do Luz do Saber ocorrendo Brasil afora. Com base na troca de experiências, em especial com a equipe de educadores de Goiânia, foi possível desenhar um projeto “piloto”. Nossa intenção foi atender à necessidade identificada no bairro Guaíra, em Águas Lindas. Mas também pretendíamos refletir sobre a experiência, identificando a maneira mais adequada de ampliar o atendimento para o Distrito Federal.
A proposta se fundamentou no desenvolvimento concomitante do trabalho pedagógico com assistência social aos estudantes. Para isso, baseou-se na interação entre um educador, responsável pela alfabetização dos alunos; uma educadora social, que acompanhou suas necessidades em termos materiais; e em um grupo de educadores voluntários, responsáveis por auxiliar nas aulas, planejar as atividades e refletir sobre a experiência. O diagrama abaixo resume a ideia.
Considerando este tripé para o funcionamento do Projeto, a equipe decidiu:
Remunerar duas pessoas fixas no atendimento aos estudantes – O projeto pagou ajuda de custo para um alfabetizador e uma educadora social. Os dois foram selecionados considerando dois critérios: (1) terem recebido formação no software Luz do Saber; (2) Residirem nas proximidades do Ninho dos Artistas. O alfabetizador foi a pessoa de referência fixa para os estudantes em relação à questão pedagógica.
Educadora social, uma novidade – Embora tenha auxiliado nas aulas, especialmente na segunda fase de alfabetização, esta possuía a função de acompanhar o cotidiano dos estudantes em relação às suas necessidades de acesso às políticas públicas de assistência social. Dessa forma, ela visitava as casas, identificando o motivo de faltas e desistências, acompanhando os estudantes em suas demandas junto ao Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), entre outras atividades. Ao longo dos dois ciclos de alfabetização, a educadora social encaminhou seis pessoas para consulta oftalmológica, uma para cardiologista e um casal para tratamento de dependência química. Auxiliou duas pessoas na renovação de Bolsa Família e no cadastro do Programa Morar Bem. Encaminhou duas pessoas para tirar carteira de identidade. Facilitou o acesso de uma pessoa a cesta básica, e a material de construção para outra.
Reforço no voluntariado – A ênfase na ação dos voluntários se deu em duas frentes:
(1) realização de “aulas especiais”­– Essas aulas foram elaboradas por voluntários que se dispuseram a realizar trocas com os estudantes sobre assuntos que conheciam. Ocorreram aulas especiais de diversos tipos e formatos (veja Box).  
(2) constituição de um grupo de educadores populares capazes de refletir sobre a metodologia de trabalho, enriquecê-la com novas abordagens e multiplicá-la em outros âmbitos. Para isso, ocorreram três formações específicas sobre o software Luz do Saber, das quais participaram pessoas de diversos núcleos do CEBUDV e integrantes da Casa da União (veja Box). Houve também reuniões específicas para trocas pedagógicas com outros grupos, como o Centro de Educação Paulo Freire (Cepafre), sobre palavras geradoras, e a Rede de Educação Cidadã (Recid), sobre cartas pedagógicas (veja Box).  Dentre o grupo de voluntários destaca-se a equipe de coordenação, que além de auxiliar o alfabetizador e a educadora social a planejar as atividades também auxiliou na sistematização da experiência (veja Box).

Hora de aula!

As aulas obedeceram a uma dinâmica que tinha por objetivo ser sempre atrativas aos estudantes. Eram momentos em que as pessoas podiam esquecer as duras jornadas de trabalho, o transporte e o cansaço físico, mergulhando no encantamento de interagir e aprender. Em geral, as aulas tinham os seguintes momentos:
·         Dinâmica de acolhimento: tempo para interação inicial, seja por meio de um vídeo, seja por meio de uma roda de “causos”, piadas, jogos, etc., em que era introduzido o tema da aula.
·         Atividades na mesa alfabetizadora: em que as interações convergiam para a atividade do dia. Eram utilizados para isso, revistas, papéis, lápis de cor, cola, de forma que a aprendizagem se dava de forma lúdica. Os estudantes faziam os exercícios propostos e eram convidados a corrigi-los utilizando a lousa, socializando as aprendizagens.
·         Atividades no computador: momento em que os estudantes podiam trabalhar o tema da aula sozinhos, de acordo com o seu ritmo de aprendizagem. Como este momento era o mais esperado do dia, optou-se por colocá-lo por último. Dessa forma, os estudantes não saíam antes da conclusão das aulas.
·         Celebrações: Uma vez por mês havia momentos de confraternização para homenagear os aniversariantes do mês, cujos nomes estavam registrados no mural. O início e o fim dos ciclos de alfabetização também foram momentos marcantes de troca com a comunidade, autoridades municipais e parceiros da iniciativa. Para esses momentos, os estudantes eram convidados a participar ativamente, fazendo cartazes, cartas, cartões, convites como parte do processo de aprendizagem.
A produção de cada estudante foi registrada em uma pasta específica. Ali estão guardados os trabalhos especiais realizados na mesa alfabetizadora, os testes iniciais para saber o seu nível de alfabetização e os testes finais para atestar o desenvolvimento obtido.

Duas turmas distintas, a primeira que se formou com nove meses de aulas e a segunda com pouco mais de sete meses, que aos poucos  pelo caminho,  foram partilhando suas dúvidas e saberes, e conhecendo os números, as letras, até mesmo por recortes de revista e bordados em linhas coloridas, se reconhecendo enquanto gente.
Rodrigo Garcia,
educador do Projeto



Acompanhando o desenvolvimento dos estudantes
A seguir, registros feitos pela educadora social, Maria Ivete Queiroz, sobre suas percepções do desenvolvimento ocorrido com quatro estudantes que participaram da primeira e da segunda turma do Projeto Luz do Saber em Águas Lindas:

Aluna
Natália Alves de Oliveira
 Idade
34 anos
Sonho
Continuar estudando
Natália só sabia escrever (desenhar) seu nome. Conhecia as letras, dizia que não conseguia aprender, tinha autoestima muito baixa. Dizia que não nasceu para saber ler, mas pouco a pouco e com paciência conseguimos que ela percebesse que, como qualquer pessoa, ela também poderia ser alfabetizada. Ela participou da primeira e da segunda fase. Hoje ela sabe ler e escrever muito bem. Mas foi preciso ela participar das duas fases do Luz do Saber.
Obs.: A Natália pra mim foi um desafio. Ela é uma pessoa carente de tudo. Tinha que trabalhar com ela todos os dias, mostrando que ela é uma pessoa capaz e com direitos, como todas as outras.

Aluno
Lindomar Gomes de Souza
Idade
34 anos
Sonho
Ter um emprego melhor
Lindomar só estudou até a primeira série do Ensino Fundamental. Iniciou sem saber as sílabas. Mas era muito interessado em aprender. Quando terminou a primeira fase do Luz do Saber já sabia ler e identificar as sílabas, formar palavras com duas sílabas. Na segunda fase aprendeu a ler e a escrever corretamente.
A companheira dele me procurou muito feliz, dizendo que ele já estava lendo mensagem no celular. Terminou a segunda fase completamente alfabetizado.

Aluno
Humberto Farias de Lima
Idade
44 anos
Sonho
Conhecer novas palavras
Humberto tinha estudado na infância. Só sabia escrever o nome e reconhecer as sílabas. Sempre presente nas aulas, levava tarefas para casa. Participou das duas fases do projeto Luz do Saber, pois na primeira fase não ficou completamente alfabetizado.
O Humberto levava um caderno para escrever as palavras que ele achava difíceis. Se destacou nas aulas no computador, sempre copiando no seu caderno. Foi alfabetizado completamente. Ficava encantado com palavras novas, que ele dizia que nem sabia que existiam.

Aluna
Antônia Ferreira dos Santos (Tânia)
Idade
58 anos
Sonho
Saber pegar um ônibus
Iniciou, na primeira fase, sabendo escrever seu nome. Não sabia ler, conhecia apenas o alfabeto, mas era muito interessada. Às vezes ficava deprimida, dizia que estava demorando muito para aprender. Mas teve incentivo para continuar. Na segunda fase, ela disse que a memória dela estava melhorando e um dia ela me disse que parecia que tinha aberto uma janela dentro da cabeça dela e que as palavras iam entrando e ficando.
Hoje a Tânia é alfabetizada e disse que não precisa mais pedir às pessoas para ler o itinerário dos ônibus, pois ela mesma já sabe ler. Na conclusão da segunda fase, ela comprou um livro de alfabetização para ela ler em casa. Foi preciso a Tânia participar das duas fases do Luz do Saber pra ser alfabetizada.





Aulas especiais: compartilhando talentos

Nas duas turmas do Luz do Saber, as aulas especiais eram momentos bastante esperados por todos. Nessas ocasiões, a rotina se rompia e os estudantes podiam conhecer outros educadores, além daqueles presentes em seu cotidiano. Enriqueciam-se com o conhecimento do educador voluntário, que se dispunha a interagir com base no saber de sua especialidade.
Um desses educadores voluntários foi Auricélio Timbó. Já que o software Luz do Saber só trabalha o letramento, esse educador voluntário dava aulas de Matemática, desenvolvendo as operações de adição e subtração, o que fez enorme sucesso entre os estudantes. Afinal, eles também necessitam conhecer minimamente as quatro operações em seu cotidiano. (foto)
Além das aulas de Matemática, ocorreram diversas aulas, como contação de histórias (foto), pesquisa na internet, culinária do Cerrado. Dentre as aulas especiais, algumas resultaram em produtos realizados pelos alunos:
Bordado – Ministrada pelas educadoras populares e bordadeiras, Aldinéia Oliveira e Érika Cortez, essa aula foi idealizada como estratégia para desenvolver a coordenação motora fina, necessária à escrita cursiva. Grande parte das pessoas mais velhas ou acostumadas a tarefas pesadas, como assentamento de tijolos, por exemplo, possuem dificuldade em pegar no lápis e escrever com confiança. O exercício consistiu em ensinar os estudantes a bordarem sua própria assinatura.
Inicialmente, havia entre alguns educadores o temor de que a aula fosse gerar constrangimento para os homens, já que o ato de bordar é socialmente considerado como “coisa de mulher”. Surpreendentemente, foram os homens que responderam à aula com mais animação e melhores resultados. O produto desta aula, transformado em um estandarte com todas as assinaturas, foi apresentado na confraternização que marcou o fim do primeiro ciclo de alfabetização. (foto das pessoas bordando e do estandarte)

“Um diferencial positivo que quero ressaltar é a ideia de experimentar aulas especiais: que foram abrindo novas perspectivas, aproveitando o saber de pessoas simpatizantes do projeto que atuam em diversas áreas: bordado, música, astrologia, saúde, plantio... Enfim, a proposta é agregar os saberes de amigos do projeto aos saberes dos educandos e vice-versa.”
Aldinéia Oliveira, educadora voluntária

A Carta – O correio é cada vez mais usado para envio de cobranças, ações judiciais, cartas de deputados em véspera de eleições. Pouca gente manda cartas de amor pelo correio. Resgatar a carta como uma forma de comunicação simples e barata – especialmente para quem está começando a ler e a escrever – tornou-se o objetivo dessa aula. Tarcísio Rodopiano, profissional dos Correios e educador voluntário, foi ao Ninho dos Artistas vestido a caráter. Sua chegada causou surpresa, pois ele simulou a visita de um carteiro: bateu na porta e perguntou quem estava na residência. Desenvolveu o conceito de comunicação pessoal por meio da escrita: como se escreve uma carta, a importância do endereçamento, como se encontra o CEP, as dificuldades do carteiro para entregar uma correspondência com erros de endereçamento. Mostrou aos alunos qual é a trajetória da carta para chegar do remetente ao destinatário.  Como lição de casa, Tarcísio pediu que os alunos escrevessem uma carta para alguém de quem gostam. E o fim de ano foi marcado por diversas cartas endereçadas pelos alunos aos seus colegas de classe.


Formações no software Luz do Saber

Antes e durante os dois ciclos de alfabetização em Águas Lindas ocorreram três formações sobre o software Luz do Saber. As atividades, com duração média de 8 horas cada uma, envolveram educadores voluntários de diversos núcleos da UDV em Brasília e seguiram praticamente o mesmo roteiro: origem, evolução e princípios da metodologia Luz do Saber e práticas pedagógicas relacionadas.
Em seguida, os participantes (cerca de 20 pessoas por formação) foram convidados a conhecer o ambiente alfabetizador, adentrando o software e suas múltiplas funcionalidades, conhecendo e explorando item por item do menu:
·    Cadastramento
·    Planejando com o módulo "começar", 
·    Construção do crachá e atividades
·    Vivenciando e planejando o módulo "escrever"
·    Vivenciando e planejando o módulo "ler"
·    Manual pedagógico
·    A importância das atividades de lápis e papel na mesa alfabetizadora
·    Uso da música e do karaokê
·    Edição de imagens
·    Edição de jornal e gibis
O software se baseia em palavras geradoras pesquisadas em âmbito nacional. Mas dá ao educador a possibilidade de editar novas aulas utilizando palavras geradoras identificadas na realidade dos estudantes. Portanto, a formação prevê também, como atividade prática complementar à formação, a preparação de aulas. 


“O Saber Fazer, como gosto de chamar a Oficina de Formação, é o momento onde a semente do Luz do Saber é plantada e em solo fértil já começa a germinar e até hoje, dando belos frutos”.
Lauréti Mascarin,
ex-coordenadora nacional do Luz do Saber




Contatos com o Cepafre e a Recid

Durante o Projeto houve momentos de trocas com outras instituições que desenvolvem trabalho de educação de jovens e adultos. Dentre os contatos realizados, dois resultaram em encontros formativos.

Palavras geradoras e ambiente alfabetizador: dicas de Maria Madalena
Em outubro de 2012, durante o primeiro ciclo de alfabetização, ocorreu uma formação pedagógica com a professora Maria Madalena Torres, presidente do Cepafre e integrante do Fórum EJA-DF. Maria Madalena relatou sua experiência com o levantamento de palavras geradoras em comunidades, indicando os critérios e a metodologia para essa definição. Enfatizou a necessidade de se criar um ambiente de acolhimento dos estudantes, a importância da autoformação da equipe de educadores, bem como o monitoramento e a avaliação constantes.  

“O contato que fiz com a professora Maria Madalena resultou em um maravilhoso encontro, onde ela nos passou um pouco da sua experiência e um riquíssimo aprendizado a respeito do processo de alfabetização de adultos. A partir desse encontro uma importante parceria foi firmada entre o luz do saber em Águas Lindas e o Cepafre.”
Luana Paz,
coordenadora pedagógica da
2ª turma do Luz do Saber em Águas Lindas



Sistematização de processos educativos: as cartas pedagógicas
Em abril de 2013, próximo à finalização do primeiro ciclo de alfabetização, ocorreu um novo encontro. Desta vez com William Silva Bonfim, assessor da Recid, vinculada à Presidência da República. Foi uma tarde de diálogos sobre as chamadas Cartas Pedagógicas, um recurso metodológico utilizado por Paulo Freire para relatar e sistematizar processos educativos.
Desse encontro participaram 20 pessoas, entre amigas e amigos do Luz do Saber e educadoras do Cepafre. Além da introdução ao tema, foi possível exercitar na prática a criatividade das duas equipes formadas, que produziram as cartas pedagógicas que se encontram no Anexo 1 desta publicação.  




Grupo de planejamento, registro e sistematização

O trabalho de planejar as atividades em sala de aula nunca foi uma tarefa solitária do alfabetizador. Sempre contou com um grupo de apoio, composto pelas pedagogas Rafaela Fortes e Luana Paz (que coordenaram o trabalho, respectivamente, na primeira e na segunda fases do Projeto), pela coordenadora do Luz do Saber Nacional, Lauréti Mascarin, que se dispôs a acompanhar o processo no DF, pela monitora da Beneficência do Núcleo Luz do Oriente, Sílvia Salim, pela responsável pelo Projeto junto à Casa da União, Tereza Moreira, e pelos dois educadores contratados pelo Projeto: Rodrigo Garcia e Ivete Queiróz.
Na primeira turma, o grupo de planejamento se debruçou mais sobre questões operacionais, administrativas e de logística do projeto (organização do espaço, problemas com os computadores, funções da educadora social, etc.). Na segunda turma, porém houve uma ênfase maior no planejamento das aulas e em arranjos para avaliar melhor o processo de aprendizagem dos estudantes. Um exemplo de planejamento das aulas pode ser visto no Anexo 2 desta publicação.
Registro das atividades
As atividades realizadas pela equipe do Projeto foram registradas por meio de fotos, depoimentos em vídeo e relatos escritos. O educador Rodrigo Garcia fez a maior parte dos registros. Mas outros voluntários também produziram vídeos e outros materiais, grande parte dos quais está disponível no blog do Projeto.
O grupo instituiu uma lista de email para contatos frequentes. Dessa forma, o cotidiano em sala de aula, com seus respectivos registros, bem como encontros e eventos ocorridos, eram socializados com todas as pessoas de referência para o Projeto. 
Avaliação
Na primeira fase do Projeto a equipe percebeu que não havia realizado a avaliação inicial dos estudantes. Por isso, no final dessa fase não possuía elementos suficientes para saber como eles evoluíram. Havia pastas, onde estavam registrados os trabalhos de cada um. Com isso foi possível avaliar o progresso obtido, que ficou evidente também pelo aumento da autoestima, pela crescente desinibição e pela capacidade de interação social que se observou no período entre a aula inicial e a confraternização final.
Na segunda turma, a equipe optou por realizar uma avaliação processual, que estivesse inserida no cotidiano da sala de aula de tal modo que o aluno pudesse ser avaliado dentro do processo natural de aprendizagem, evitando as tensões naturais dos testes e provas. Essa forma de avaliação exige dos educadores uma regularidade nos registros dos avanços e das limitações enfrentadas pelos alunos, além da organização de uma pasta na qual todo material produzido pelos estudantes pudesse ser guardado, servindo de análise também para avaliação.

Pude contribuir neste projeto, auxiliando na coordenação pedagógica, planejando as aulas juntamente com a equipe de voluntários, monitores diretos, sendo que, no início, no período de implantação e organização do Projeto Luz do Saber em Águas Lindas de Goiás, também auxiliei em visitas nas casas da comunidade local, fazendo pré-inscrições e explicando o que era o projeto para as pessoas que estavam sendo visitadas. Foram feitas algumas reuniões para chegarmos à organização que tivemos para iniciar as aulas no ano de 2012, que foram valiosas, pois estruturaram todo o processo de organização das aulas.
Rafaela Fortes,
coordenadora pedagógica da primeira turma
do Luz do Saber em Águas Lindas
O foco da sistematização realizada

Um dos objetivos do Projeto era produzir reflexões sobre a prática e extrair lições capazes de dar subsídios para novas iniciativas do Luz do Saber no Distrito Federal. Por isso, no fim dos dois ciclos do Projeto, a equipe envolvida mais diretamente nas atividades se debruçou sobre a experiência buscando refletir sobre ela. Partiu-se da ideia de sistematizar no sentido de “transformar em sistema de conhecimento que produza ação”.
Como ponto de partida, as pessoas mais envolvidas nos dois ciclos de alfabetização escreveram cartas pedagógicas, em que focalizaram sua atenção sobre: (1) qual sua atuação no projeto; (2) que aprendizagens colheram dessa vivência; (3) que fragilidades identificaram; (4) que potencialidades conseguem ver na experiência; (5) o que fariam diferente. O conjunto de cartas produzidas se encontra no blog do Luz do Saber Águas Lindas.
As cartas foram lidas coletivamente durante um encontro inicial. Com base na diversidade de visões, fruto dos diferentes lugares que as pessoas ocuparam no Projeto, o grupo conseguiu chegar a três perguntas orientadoras para a sistematização:
1.       Que princípios orientaram o Projeto do Luz do Saber em Águas Lindas e podem ser aproveitados em outras iniciativas de alfabetização de adultos?
2.       Que ambiente de trocas pedagógicas e de relação com a comunidade local foi criado a partir do Projeto? Que estratégias podem ser utilizadas para aprimorar este contato?
3.       Que importância este projeto teve para o trabalho de beneficência desenvolvido pelo CEBUDV e o que fazer para que seja mais compreendido e valorizado?
Foi, então, elaborado um cronograma de três reuniões (uma a cada mês), nas quais o grupo se debruçou sobre cada questão. Mais do que momentos de reflexão, os quatro encontros realizados potencializaram as relações de amizade, em que os participantes trocaram mais do que idéias, mas sentidos existenciais, vivenciando momentos de intimidade e compartilhando o aconchego das casas de integrantes da equipe que ainda não tinham sido visitadas antes.
(colocar fotos das quatro reuniões)

Aprender a ler vai muito mais além do que juntar sílabas e palavras. Quando a leitura está relacionada à realidade da pessoa no local em que ela vive, pode transformar a vida de uma pessoa, melhorar a autoestima, ampliar os horizontes e desenvolver a cidadania.
Márcio Santiago,
ex-presidente da Casa da União





Pergunta 1: Que princípios orientaram o Projeto do Luz do Saber em Águas Lindas e podem ser aproveitados em outras iniciativas de alfabetização de adultos?
Em torno dessa questão, a equipe de sistematização identificou elementos-chaves para o Projeto e que podem servir como referência para outras iniciativas do Luz do Saber.

1. Ler e escrever com auxílio do computador: Para além das facilidades do uso da máquina e do software, o uso do computador é uma forma de fugir do preconceito de ser analfabeto. Para os vizinhos e amigos, as pessoas diziam que estavam indo para a aula de informática. Além disso, quando desmistificam a máquina, os alunos passam a lidar com o mundo virtual (internet), um universo do qual eles se mantinham excluídos.
2. A mão dos educadores é o fio condutor do caminho: Lidar com a máquina é importante. Mas não dispensa a necessidade de uma pessoa com formação suficiente para mediar essa relação do estudante com a informação. Por meio dessa mediação se descortina um novo universo para a pessoa que inicia o seu processo de alfabetização. A relação pedagógica envolve contato humano e, para isso, é fundamental a existência de dinâmicas iniciais de acolhimento, rodas de conversas, piadas, capacidade de ouvir e interagir com o outro.
3. Estabelecimento de relações de empatia: Para ser eficaz, a alfabetização necessita resgatar o seu caráter humanizador e emancipatório. Cada momento de encontro e aprendizagem contribui para fortalecer as relações entre as pessoas e conduzir a um processo de ganho de autonomia dos educandos. Essas características tornaram as duas turmas de alfabetização muito atraentes aos estudantes. Alguns deles, ao concluírem a primeira turma, manifestaram interesse em continuar a estudar na segunda turma. Diversas pessoas que estudavam na EJA convencional se mudaram para o Ninho dos Artistas, alegando que lá havia um ambiente de carinho, aconchego e também regularidade nas aulas, já que os professores não faltavam. A criação de um ambiente amistoso favoreceu o processo educativo.
4. Valorização do saber do educando: O educador não é o dono da verdade; é uma pessoa que, por meio de conhecimentos técnicos, cria o repertório capaz de facilitar a aprendizagem. Isso se reflete na busca de palavras geradoras adaptadas ao cotidiano dos estudantes. O fato de se considerar o que as pessoas traziam em sua bagagem cultural gerou adaptação de algumas aulas com base no interesse dos alunos. No software existe flexibilidade para criar novas aulas em torno de palavras geradoras usadas no local.
5. Trabalho com base no voluntariado: O projeto contou com a remuneração de duas pessoas, justamente aquelas que residem em Águas Lindas e estavam diretamente ligadas ao cotidiano de sala de aula. Muitas outras, no entanto, exerceram o seu trabalho de forma voluntária, uma característica valorizada no CEBUDV. Explorar o potencial do voluntariado é um trabalho de mão dupla: além de sentirem-se fazendo o bem, as pessoas que se envolveram tiveram ganhos pessoais e profissionais. A sensação de dar o melhor de si auxiliou a criar relações interpessoais mais ricas e fortaleceu os elos de amizade. Ao longo de todo o processo foi possível perceber o crescimento de um senso de equipe e de pertencimento entre os envolvidos.
6. Grupo de aprofundamento teórico: As formações realizadas foram fundamentais para o enriquecimento do trabalho pedagógico. A combinação entre domínio técnico e flexibilidade para se adaptar ao que acontece cotidianamente requer experiência do educador. A disposição para a pesquisa e para o envolvimento com instituições como a Universidade de Brasília e a Universidade Brasil Central é de suma importância. O projeto Luz do Saber pode ser o celeiro para a formação de profissionais de Pedagogia socialmente engajados e mais capacitados tecnicamente por meio de estágios nos laboratórios criados. As negociações com essas instituições podem avançar considerando-se futuros processos de alfabetização.  
7. Parceria entre diversas instituições: A iniciativa não seria possível sem o conhecimento no software disponível na Casa da União; a força do voluntariado do Núcleo Luz do Oriente; o espaço físico, a infraestrutura e o pertencimento à comunidade de Águas Lindas como legados do Ninho dos Artistas; e o fluxo de recursos financeiros favorecido pelos patrocínios. Cada parceiro com sua particularidade. Algumas questões que surgiram ao longo do processo merecem destaque: a necessidade de negociações e exercício de tolerância mútua entre as entidades para a consecução dos objetivos; a necessidade de explicitar que embora seja um ato político, a alfabetização não estava vinculada a nenhum projeto político-partidário e não tinha a intenção de converter os alunos à crença espiritualista, em especial porque a maioria deles era evangélica. Houve sempre um cuidado por parte dos educadores em não fazer apologia religiosa e manter discrição quanto à origem das pessoas voluntárias. A interação entre as instituições envolvidas se deu com tranquilidade, demonstrando que essa parece ser uma tendência para futuras iniciativas de implantação dos laboratórios do Luz do Saber.

Para alfabetizar é preciso paciência, dedicação e continuidade. O programa Luz do Saber facilita o trabalho, pois ele vem pronto, com todas as aulas necessárias para ler e escrever, as atividades no computador e no lápis e papel. Tudo pronto. Mas, sem perseverança não se chega à vitória. A mão do professor é o fio condutor do caminho. 
Lauréti Mascarin,
ex-coordenadora nacional do Luz do Saber   



Pergunta 2. Que ambiente de trocas pedagógicas e de relação com a comunidade local foi criado a partir do Projeto? Que estratégias podem ser utilizadas para aprimorar este contato?

A equipe de sistematização examinou as trocas pedagógicas realizadas entre educadores/educandos, entre os próprios educandos e entre os educadores. O objetivo foi identificar fragilidades e potencialidades que essas relações tiveram no desenvolvimento do Projeto. A contribuição do Luz do Saber para a comunidade também foi objeto dessa reflexão.

Os dois ciclos do Luz do Saber em Águas Lindas tiveram características diferenciadas. No primeiro ciclo, os planejamentos realizados enfatizaram a solução de problemas surgidos na infraestrutura e na administração de pessoal. As deficiências de planejamento pedagógico, no entanto, foram contornadas pela existência de uma equipe de voluntários muito maior e pela criatividade e busca de referências teóricas e práticas que transcenderam em muito o conteúdo do manual do Luz do Saber.
No segundo ciclo, com a experiência administrativa adquirida, a equipe teve mais tempo para debruçar-se sobre o planejamento pedagógico. O número de voluntários diminuiu, mas os educadores que prosseguiram puderam explorar melhor os recursos já existentes no software, aprofundando o conhecimento de como manuseá-lo. Além disso, desenvolveram e utilizaram mais mecanismos de avaliação, embora não tenham conseguido a constância no registro das atividades originalmente previsto.
Desafios e potencialidades identificados
Durante a reflexão da equipe de sistematização, os fatores que causaram limitações ao processo pedagógico e as consequentes fragilidades presentes em cada ciclo não foram consideradas necessariamente problemas, mas possibilidades de aprendizagem e superação. Dentre os aspectos que mais se destacaram podem-se citar:
Infraestrutura do local – O ambiente foi remodelado e aprimorado ao longo do tempo para receber os estudantes. Porém, no primeiro momento houve dificuldades com:
·         funcionamento dos computadores – Na primeira turma, o ambiente alfabetizador não era usado exclusivamente pelos alunos do Projeto. Havia outros usuários durante o dia, em geral jovens. Como as máquinas eram, em sua maioria, de segunda mão, quebravam facilmente e exigiam manutenção constante. Isso nem sempre ocorria com a frequência necessária. Em pouco tempo, os fones de ouvido, comprados para facilitar a interação individual entre aluno e máquina, começaram a estragar. A solução encontrada foi conseguir novos fones de ouvido e encarregar um aluno por noite de recolher e guardar os fones no armário usado pelo Projeto.  
·         posição das máquinas – um dos educadores apontou a disposição inadequada das máquinas, que foram instaladas ao longo das paredes, como um fator limitante. Num próximo ciclo é importante rever a forma de organização espacial dos computadores, para que eles fiquem de frente para o quadro ou para o datashow, facilitando as orientações do professor.
·         instabilidade da internet (via rádio) – Esse fator dificultou o acesso ao software Luz do Saber. Uma solução foi instalar o programa em cada máquina. Mas nem sempre as máquinas suportavam o programa. Tal situação constituiu uma limitação na primeira e na segunda turma.
·         sistema centralizado de iluminação do local – A iluminação centralizada para todo o salão dificultava o uso de datashow para exibir filmes e outros tipos de apresentações.  
·         instabilidade da rede elétrica – Como os dois ciclos tiveram início em agosto, as aulas ocorreram no período mais chuvoso. Chuvas frequentes causam instabilidade na rede elétrica, causando interrupções nas aulas. Mas vale registrar que estas começavam pontualmente, com ou sem chuva.
Evasão inicial – Nos dois ciclos houve evasão inicial significativa. As pessoas se matriculavam, mas não compareciam nem mesmo na aula inaugural. No primeiro ciclo, das 26 pessoas que se matricularam apenas 21 começaram a frequentar regularmente. No segundo ciclo, 22 alunos se matricularam e de imediato 4 não compareceram.
A evasão foi justificada por alguns devido ao horário de volta do trabalho, ao cansaço físico (força de trabalho – diarista, pedreiro, vidraceiro), problemas de saúde, relação com comunidade religiosa (prioridade para os cultos), alcoolismo, mudança de moradia.
Visando criar um ambiente convidativo e evitar mais evasão foram usadas diversas estratégias pedagógicas. Um estudante que teve um dia ruim necessita um tempo para se integrar ao ambiente da aula. As rodas de conversa, contação de piadas, jogos e outras atividades lúdicas foram realizadas com o intuito de facilitar esse desligamento dos problemas cotidianos e sintonizar a frequência da aula na mente e na emoção dos estudantes.
Presença de crianças nas aulas – Este foi um desafio maior durante a primeira turma. Havia três casais que levavam as crianças para as aulas, pois não tinham com quem deixá-las. A presença das crianças dispersava a atenção do grupo, devido às brincadeiras e até mesmo ao fato de tomarem o lugar dos adultos diante do computador. Algumas delas, na intenção de auxiliarem seus pais, às vezes realizavam as atividades por eles e não com eles.
A equipe de educadores examinou a situação, considerando a possibilidade de desenvolverem atividades do Luz do Saber Infantil para que as crianças também pudessem estudar. Mas logo ficou claro que isso caracterizava um desvio de função para os educadores. Por fim, decidiu-se que no segundo ciclo haveria a exigência de que os estudantes deixassem as crianças em casa. Embora isso nem sempre acontecesse, o problema ficou menor no decorrer da segunda turma.
Diferentes idades e níveis de aprendizagem – Esses dois fatores combinados representaram um desafio para a equipe de educadores, que desenvolveram visões distintas sobre a forma de lidar com estudantes com idades muito diferentes – de 18 a 68 anos. Nos dois ciclos havia pessoas em diversos estágios de desenvolvimento: pré-silábico, silábico, silábico-alfabético e alfabético.
Havia a tendência inicial de dividir a turma em dois subgrupos, de acordo com o nível de progresso de cada aluno. Essa estratégia foi substituída, mais tarde, pelo encorajamento de se ter alunos mais adiantados interagindo com os de menor desempenho. Os educadores davam tarefas de casa para os mais idosos como estratégia para que memorizassem o que realizaram em aula. A formação de palavras era um exercício realizado com todos juntos, para dar oportunidade dos mais adiantados ensinarem aqueles que tinham desempenho inferior. A correção coletiva dos ditados, realizada no quadro, também era muito apreciada pelos alunos.
Essa forma de aprendizagem colaborativa foi adotada e serviu como mecanismo de maior aproximação e criação de laços de amizade entre os estudantes. Constatou-se, ao longo do processo, que as trocas entre os alunos facilitam essa percepção de que estavam aprendendo. O ambiente pedagógico gerado criou este clima.
Interferência do regionalismo na fala e na escrita – A forma como os estudantes aprenderam a falar era a forma como queriam escrever. Havia influência regional na dificuldade de se adaptarem à norma culta da escrita. A vinda para Brasília mostrou a eles que estavam falando “errado” e que possuíam deficiência na percepção dos sons. Desde cedo ficou claro para a equipe de educadores que era importante compreender as etapas de desenvolvimento dos estudantes, respeitar e valorizar o seu saber, mas oferecer opções da chamada “norma culta”, para que eles pudessem adentrar os espaços formais da educação. Afinal, preparar os estudantes para darem continuidade aos estudos era um dos objetivos do Projeto.
Identificou-se a necessidade de atividades de apoio para que os alunos se apropriassem da norma culta na fala e na escrita. A audição do som das vogais e das consoantes no computador, bem como as atividades individuais com o alfabeto móvel auxiliaram os alunos a perceberem as distinções entre a fala coloquial e a escrita.
Ambiente metodológico – O fato de não se ter carteiras, com os alunos atuando em círculos  em torno da mesa alfabetizadora, criou um ambiente estimulante. Nas paredes havia murais, letras, números, palavras e frases. O acesso fácil a revistas e livros despertou o interesse em ler.
Educadores e educandos no mesmo bairro – O fato de professores e estudantes se encontrarem na rua e se reconhecerem como pessoas que vivem a mesma realidade facilitou o processo pedagógico, sobretudo no segundo ciclo. Em um ambiente comunitário marcado por desafios, os professores são confidentes dos problemas. Precisam ter abertura e disponibilidade para ouvir. Cada aluno traz sua bagagem para a sala de aula. O educador precisa cumprir as metas de alfabetização, mas também estabelecer um clima de proximidade e motivação.
Em especial, a educadora social desenvolveu proximidade, relacionando-se com os estudantes em seu cotidiano. Nas turmas observou-se a criação de laços de amizade que ultrapassaram o ambiente de sala de aula. Alguns deles passaram a se visitar e a vir juntos para as aulas.
Relação de confiança entre o educador/educando – O fato de se ter dois educadores fixos no Projeto possibilitou um ambiente de continuidade, sem as ausências frequentes de professores que os alunos relataram em relação à EJA. Nessa relação entram também outros ingredientes que precisam ficar claros na seleção e na formação dos educadores. O conhecimento técnico é muito importante, mas não basta. É necessário que os educadores tenham, além de boa formação profissional, qualidades como cordialidade, real interesse pela aprendizagem dos alunos, empatia e amizade.
Ênfase no planejamento participativo – A dinâmica adotada no Projeto mostrou a diferença entre um planejamento desenvolvido pelo educador de forma isolada e com base apenas no que contém o Manual do Luz do Saber e a riqueza do trabalho coletivo. Os processos se tornaram mais ricos, com abordagens mais diversificadas e criativas. Isso gerou um ambiente de formação profissional permanente, criando oportunidades de trabalho para os sócios da CEBUDV que se engajaram no processo.
Equilíbrio entre o planejado e o imprevisto – O curso de formação de educadores auxilia (estrada), mas é preciso capacidade para improvisar (veredas). Os educadores que vão chegando demoram um pouco pra começar a entender o que fazer nas aulas. O que se planeja nem sempre funciona na hora da aula, diante de situações imprevistas que surgem, como a queda de energia, perda de algum exercício no computador devido a problemas com a internet, entre outras. É preciso usar os recursos que estão disponíveis na hora, tendo como foco o que foi planejado originalmente, mas adaptando-se ao momento.
Necessidade de reforço no registro e na avaliação de desempenho dos estudantes – Embora o registro das atividades e a avaliação de desempenho dos estudantes tenham melhorado da primeira para a segunda turma, ainda não conseguiram ser eficientes. A equipe de planejamento definiu que no final de cada turma seria aplicada uma avaliação estilo teste para que os alunos se familiarizassem com essa forma de avaliação, preparando-os para a possibilidade de continuarem seus estudos na rede oficial de ensino. Isso não aconteceu.
A equipe identificou a necessidade de uma presença mais constante da coordenação pedagógica no estabelecimento e no acompanhamento de rotinas.
Inserção nos cursos regulares de EJA – Embora a equipe tivesse como meta inserir os alunos que concluíram os dois ciclos de alfabetização na escolarização formal, ocorreu exatamente o inverso. Os alunos de EJA começaram a frequentar as aulas do Luz do Saber. Isso ocorreu devido a dois fatores: a proximidade espacial entre moradia e local das aulas e também o ambiente acolhedor, regular e dinâmico que foi criado no Ninho dos Artistas. Ficou clara a fragilidade do serviço público prestado na região em relação à continuidade dos estudos por meio da rede pública de educação.

Durante o semestre realizamos vários encontros e a forma do trabalho foi crescendo aos poucos. Conseguimos construir minimamente uma rotina com momentos pra descontração e introdução a cada assunto, momentos no computador e fixação das aulas nas mesas e lousa. Estabelecemos uma avaliação processual que se valeu dos registros, feitos pelos educadores, das atividades e dos avanços dos educandos.
Luana Paz,
coordenadora pedagógica da segunda turma
do Luz do Saber em Águas Lindas





Pergunta 3: Que importância este processo tem para a beneficência desenvolvida pelo Centro Espírita Beneficente União do Vegetal e o que fazer para que seja mais compreendido e valorizado?
A equipe de sistematização examinou o Projeto sob o ângulo da beneficência externa ao Centro e sob o enfoque da criação de capacidade entre os sócios para atuar na alfabetização de jovens e adultos.

Beneficência externa
A beneficência é inerente ao trabalho da União do Vegetal. Está expressa, inclusive, no nome da entidade. A sua própria atuação vincula-se ao bem que faz aos seus discípulos, mas também à ação de favorecer comunidades e pessoas carentes, por meio das entidades que constituem os seus braços sociais, presentes em diversas cidades brasileiras.  
O Projeto Luz do Saber e o Dia do Bem[4] foram os projetos de maior relevância voltados ao público externo, desenvolvidos pela Casa da União - Brasília durante o triênio 2012-2015.
O Dia do Bem se caracteriza como ação de âmbito nacional e, embora possua expressivo número de atendimentos, trata-se de um evento realizado uma vez a cada ano, como o próprio nome indica. Não se trata de uma ação continuada. Tem sua importância, principalmente porque coloca à disposição da coletividade os talentos existentes no âmbito do Centro por meio de seus sócios (dentistas, advogados, psicólogos, fisioterapeutas, massagistas, entre outros).
O Projeto Luz do Saber tem uma atuação mais sistemática. Embora voltado a um número limitado de pessoas, realiza-se com o objetivo de mudar a realidade destas de forma mais permanente. Ali os estudantes iniciam novas relações sociais, desenvolvem-se na leitura e na escrita e aprendem a ver o mundo com novos olhos.
No caso de Águas Lindas de Goiás, as duas iniciativas foram complementares. A realização de diversas ações do Dia do Bem no Ninho dos Artistas gerou credibilidade da Casa da União na comunidade local. Isso fortaleceu a entidade para um trabalho mais continuado.
A produção coletiva de conhecimento, que ocorreu nas duas turmas do Luz do Saber, qualificou o trabalho de beneficência realizado pelo Centro. Marcou uma mudança de perspectiva – do assistencialismo (dar o peixe) para a conquista de maior autonomia das pessoas que se alfabetizam (ensinar a pescar). Isso ocorreu tanto em sala de aula quanto nos encaminhamentos de alguns alunos à assistência social, realizados pela educadora social.
A possibilidade de procurar atendimento médico, conhecer os seus direitos também educa e melhora a qualidade de vida das pessoas. Algo que se aprende e não se esquece mais. Os servidores públicos, especialmente em cidades como Águas Lindas, não estão suficientemente capacitados para prestar um bom atendimento à população. Se a clientela conhece seus direitos, há maior possibilidade de comunicação e de maior sucesso no atendimento às suas demandas.
Outro aspecto considerado relevante pela equipe de sistematização foi a preocupação em não explicitar o vínculo entre o trabalho realizado pelo Projeto e um Centro Espírita. Isso ocorreu devido à predominância de evangélicos entre os estudantes. Mas com o tempo tornou-se claro que, ao humanizar as relações, o Projeto diluiu barreiras em relação à procedência dos professores como sócios de um centro espírita.
Ao se relacionar com a Prefeitura e as políticas públicas locais de assistência social, a Casa da União estabeleceu relações marcadas pelo reconhecimento do CEBUDV e do trabalho que realizamos pela sociedade mais ampla. 

A lição que aprendi é com certeza que tem pessoas que sabem menos do que eu e pessoas que sabem mais e que eu posso ensinar o pouco do que sei e aprender o que ainda não sei.
Maria Ivete Queiróz,
educadora social do Projeto

 Beneficência interna
O Projeto foi considerado exitoso, principalmente pela oportunidade que representou para os próprios sócios do CEBUDV. Recuperou em alguns de nós o encantamento de “fazer o bem sem olhar a quem”. Uma forma de retribuir o bem que recebemos dentro da União do Vegetal.
Alfabetização é uma atividade continuada, trabalhosa, que demanda compromisso, disciplina e busca de aprimoramento constante. Nesse sentido, uma iniciativa como o Luz do Saber requer o desenvolvimento de uma cultura que estimule os sócios a assumirem compromisso pela sua transformação interna e a vontade de partilhar suas conquistas interiores com os demais.
Do ponto de vista prático, esse tipo de iniciativa representa a possibilidade de profissionalização de diversas pessoas, sobretudo jovens, que trabalham na área da educação. Caso a proposta de desenvolver o Luz do receba a devida prioridade no âmbito do Centro, abre-se para essas pessoas uma clara oportunidade de trabalho, que pode ser remunerado e que apresenta claras perspectivas de crescimento profissional.
Outro aspecto a ser ressaltado é que a alfabetização de adultos, como ação beneficente de caráter continuado, contribui com a manutenção do título de utilidade pública do CEBUDV. Nos núcleos, esse trabalho é realizado pelo Departamento de Beneficência, cujo coordenador responde pela monitoria da Casa da União, que por sua vez integra a Beneficência do Centro. Devido à sua personalidade jurídica, a Casa da União pode responder institucionalmente pelo Luz do Saber, o que implica receber e repassar recursos vinculados ao Projeto.
O desenvolvimento de maior entendimento sobre a função da beneficência dentro do CEBUDV com certeza contribuirá para que iniciativas como o Luz do Saber ganhem mais espaço. São comuns os questionamentos: o trabalho de beneficência deve ser pra dentro ou pra fora? De dentro pra fora, de fora pra dentro, o Luz do Saber, com o devido apoio e acompanhamento da direção da UDV pode se converter em um bom instrumento de beneficência. Tanto em termos do aprimoramento pessoal, profissional e espiritual de seus sócios quanto em termos do crescimento da respeitabilidade do Centro perante a sociedade mais ampla. Consideramos que, fazendo beneficência pra fora, estamos beneficiando o nosso interior também: tanto o interior de cada pessoa envolvida, quanto o interior de cada núcleo da União do Vegetal.

 
Edison Saraiva Neves,
dirigente do Centro Espírita União do Vegetal
Conclusão. Conclusão?

A ação comunitária é sempre rica de aprendizados. Acreditamos que a vida partilhada, dividida e multiplicada pelo interesse no “bem do outro” tem um poder superior. Os voluntários que se irmanaram pra realizar o que hoje chamamos “Luz do Saber em Águas Lindas”, cresceram e desenvolveram importantes habilidades, que certamente farão diferença na história de suas vidas. E fizeram e fazem diferença na vida de todos os estudantes que passaram pelas atividades. E fizeram e farão diferença na história do bairro Guaíra. A maior lição, em trabalhos de inclusão e compartilhamento, é darmos as mãos e fluirmos na Ciranda da Prosperidade, Justiça, Igualdade, Partilha e Beleza.
A experiência realizada em Águas Lindas deixou claro que o foco do trabalho deve ser o conhecimento da metodologia do Luz do Saber. Cabe à Casa da União formar os formadores, deixando para possíveis parceiros a montagem da estrutura física, a remuneração e a administração dos envolvidos. Dessa forma, será possível não apenas dar escala às experiências do Luz do Saber, como criar um grupo de educadores com formação adequada e capazes de se profissionalizarem no trabalho de formar formadores, transmitir o prazer de ensinar e aprender, bem como os princípios e valores emanados do CEBUDV para este trabalho. 
Considerando a mudança de gestão na Casa da União a partir de 2015, registramos nesta publicação os principais resultados deste processo e recomendamos a continuidade da implementação do Luz do Saber no Distrito Federal devido os fatores a seguir.

Recomendações para a continuidade
1.       Durante a sua implementação, o Projeto foi amplamente divulgado na região, em especial devido aos boletins informativos produzidos pelo Ninho dos Artistas com apoio da Petrobrás. A iniciativa chamou atenção dos gestores municipais de educação de Águas Lindas. Entendimentos entre o Ninho dos Artistas e a Secretaria Estadual de Educação sinalizaram a possibilidade de se continuar as atividades com a remuneração de uma professora da Rede Pública de Educação para realizar o trabalho de alfabetização. Isso exigirá a formação tanto da professora quanto de um grupo de apoio, o que significa demanda de trabalho para a Casa da União.
2.       Da mesma forma, a Universidade Brasil Central, que possui um curso de Pedagogia em Águas Lindas, demonstrou interesse em formar seus estudantes na metodologia do Luz do Saber. A presença de estagiários para desenvolver as atividades de apoio do processo de alfabetização também constitui uma possibilidade concreta de continuidade. Só depende de contatos e negociações da Casa da União tanto com a Prefeitura quanto com a universidade.
3.       Consideramos que a presença de uma educadora social no Projeto continua a ser um diferencial positivo e que deve ser mantido, como forma de inserir os educandos na difícil aprendizagem de conquista de seus direitos sociais. A Casa da União - Brasília, com os recursos que ainda possui para financiar a iniciativa, poderá se encarregar da remuneração desta pessoa.
4.       Diante das condições existentes convém à Casa da União - Brasília e ao Ninho dos Artistas reavaliarem as possibilidades de manterem a parceria, já que as condições objetivas para a continuidade do Projeto existem. O ambiente alfabetizador permanece e existe demanda de estudantes para a realização de mais uma turma.  
5.       As escolhas realizadas durante as duas turmas do Luz do Saber reforçam o papel assumido pela Casa da União como orientadora do processo pedagógico. Nesse sentido, a presença de uma coordenadora pedagógica será essencial. Essa profissional, a ser devidamente remunerada, poderá exercer a formação de educadores, o planejamento e o acompanhamento das atividades pedagógicas realizadas, de forma a assegurar o registro das atividades e a avaliação dos estudantes como um processo permanente que retroalimenta a prática.
6.       Um dos pontos falhos do Projeto de Águas Lindas foi não ter preparado os estudantes para fazerem os exames de equivalência para tornarem aptos a frequentarem os cursos regulares de EJA. Um trabalho de coordenação pedagógica poderá sanar esta falha, possibilitando articulações com a rede pública de educação no sentido de se incentivar a continuidade dos estudos nas escolas da região.
7.       Considerando o potencial que o Projeto tem de ser assumido por outras instituições – associações tais como o Ninho dos Artistas – em diferentes pontos do Distrito Federal, uma coordenação pedagógica vinculada à Casa da União teria como missão adicional reunir um grupo de educadoras e educadores voluntários, capazes de apoiar as ações e se constituírem como um banco de talentos disponíveis a se tornarem educadores credenciados pelo Projeto. Esse grupo – que pode se constituir de jovens do CEBUDV – terá chance de se inserir no mercado de trabalho ao mesmo tempo em que apoia o processo alfabetizador desencadeado. Trata-se de um potencial para qualificar a EJA no Distrito Federal, em especial considerando-se os acúmulos obtidos nessa experiência piloto sobre a importância de formação técnica aliada a valores como o respeito, a dedicação e o acolhimento do universo dos educandos.
8.       A experiência de utilizar os talentos individuais em aulas especiais mostrou-se instigante. Por isso, a equipe de sistematização recomenda a continuidade dessa iniciativa em futuros laboratórios do Luz do Saber. É necessário, porém, que se crie uma agenda de aulas especiais, de forma que os temas desenvolvidos sejam explorados em outras aulas e se constituam como pontos para uma abordagem interdisciplinar. 
9.       Por último, mas não menos importante, uma indicação para a Casa da União, considerando um trabalho de amplitude nacional, é buscar parcerias e formas de desenvolver os três módulos restantes do software Luz do Saber. Convém que os módulos adicionais incluam atividades específicas de Matemática, sobretudo as quatro operações e os conhecimentos necessários sobre unidades de medida, essenciais ao cotidiano dos alunos.
Pra finalizar, reafirmamos a ideia original dessa sistematização, que foi mostrar o que nos impulsionou a realizar o Projeto, apresentando os caminhos que trilhamos e que podem servir de incentivo pra quem quiser realizar projetos similares. Esperamos ter contribuído para incentivar as pessoas e grupos a realizarem ações beneficentes de caráter permanente e transformador, como forma de valorizar todo o esforço de fazer o bem, numa perspectiva de contribuir para um mundo melhor e para o bem da gente mesmo.

 “Dentre as prioridades na área financeira que necessitam de atenção cito a captação de recursos, a busca de novos patrocinadores e o fortalecimento dos parceiros como metas a serem alcançadas.”
William Vaz,
tesoureiro da Casa da União


“O Projeto Luz do Saber mostrou pra mim que nunca é tarde pra aprender, os exemplos daquelas senhoras e senhores que não sabiam ler, escrever, e mesmo com o cansaço da idade avançada, da lida diária do trabalho de seus sustentos, acharam força pra participarem do Projeto, dar contribuição pra ensinarem pra mim, educador, o valor da perseverança, da transformação do olhar e da busca da memória, mostraram que já sabiam ler, não a leitura das letras, mas a leitura da vida, que já sabiam construir casas, fazer artesanato, cuidar de seus filhos, organizar a festa da igreja, fazer bolos e biscoitos e agora, ler e escrever”.
Rodrigo Garcia,
Educador do Luz do Saber


Juntos, podemos muitas coisas, importantes e duradouras.
Chico Nogueira,
educador voluntário








Anexo 1. Cartas pedagógicas produzidas durante a formação

Grupo 1:

Águas Lindas – 14 de abril de 2013
Caro William,
Nessa tarde de domingo ensolarada, em plena lua nova, no Ninho dos Artistas nos reunimos para entender melhor o valor das cartas pedagógicas, com intenção de unir os nossos pensamentos e as nossas experiências, no sentido de encontrarmos novos caminhos para sistematizar a prática das vivências da educação popular.
Por que tudo isso? Na tentativa de encontrar um novo olhar e fugirmos dos tradicionais relatórios frios e formais, para procurar aproximar da realidade da nossa prática freireana com mais amorosidade, leveza e descontração, estamos aqui para aprender como se escreve uma carta pedagógica, refletindo os sentimentos de quem faz.
Encontrando sentido para deixar outras atividades, e estar aqui por um motivo maior, o amor pela humanização da educação, descobrindo novas formas de registrar o nosso fazer pedagógico. Finalmente nossa gratidão a você, William, por nos proporcionar um encontro tão produtivo.
Abraceijos,
                Educadores:
Carla Trazzi, Aldineia Oliveira, Laureti Mascarin, Rosane Veiga Lopes, Madalena Torres, Gilberto Nascimento, Ivete Queiroz, Kelly Grigôrio, Marilda Medeiros


Grupo 2:

O que se faz numa tarde de domingo? Dormir no sofá, passear com a família, visitar os amigos e parentes, receber visitas e fazer café... Hoje foi um domingo diferente. Viemos ao Ninho dos Artistas, em Águas Lindas de Goiás, para compartilhar e receber conhecimentos, experiências sobre educação.
Fizemos percursos diferentes, alguns mais longínquos, outros mais próximos. Com um sol que há tempo não víamos, cruzamos uma ponte, debaixo dela passa água e nessas águas lindas tem um sonho. O sonho da transformação, da descoberta, da autonomia, da liberdade, por meio da alfabetização de jovens e adultos.
Nesse lugar encontramos o William, da Recid, o pessoal do Cepafre, o pessoal do Ninhos dos Artistas e da Casa da União. Aqui tem um elefante colorido, um Dom Quixote e Sancho Pança, um castelo encantado e uma meninada alegre e feliz.
É uma tarde de diálogos, que se iniciou com uma roda de apresentação. Cada pessoa entoando as vogais do seu próprio nome, nos fez reviver as nossas raízes culturais e a força que tem um coletivo atuante.
O baú se abriu e neste mês de abril começamos a entender a magia das cartas pedagógicas. Viajamos das cartas pessoais, com seus sentimentos, estórias de vida, de amor, de cumplicidades, de intrigas, para compreendermos a intencionalidade pedagógica com que elas também podem ser escritas.
As cartas trazem um contexto histórico. Na voz dos e das participantes pudemos viajar no tempo - indo de São Paulo, em sua carta aos coríntios, aos educadores de Goiânia, passando pelo sofrimento, esperança e fortaleza de Olga Benário ao relatar sua resistência ao nazismo numa carta de despedida ao marido e à filha recém nascida.
As cartas nos remetem a Paulo Freire e às suas múltiplas pedagogias, que são apropriadas e reinventadas por muita gente que acredita na transformação social e na libertação dos seres humanos. Isabela Camini sistematiza a experiência das cartas pedagógicas como uma forma de recriarmos nossas próprias experiências como educadores e educadoras.
E na boca da noite, que se aproxima, um feixe de luz invade a sala, iluminando nossos corações, renovando nossas esperanças, trazendo energia e fortalecendo o nosso ânimo em prosseguir nesta caminhada. Sofá, TV, Faustão? O sonho é muito mais interessante do que tudo isso. E, além do sonho, o compartilhar, o vivenciar o que aprendemos neste exercício de troca de saberes, que inclui a elaboração desta carta pedagógica.

Águas Lindas de Goiás, 14 de abril de 2013
Francisca Siqueira, Shirleane Borges, Vânia Nascimento, Maria do Socorro Jesus, Rafaela Fortes, Tereza Moreira, Rodrigo Garcia, Sílvia Salim, Margarida Souza 







Anexo 2. Planejamento das aulas - 1a. quinzena do curso

DATA
ATIVIDADE
RECURSOS NECESSÁRIOS
RESPONSÁVEL
09/08/2013
Aula inaugural:


Apresentação do Luz do Saber
Vídeo institucional e projetor
Rodrigo / Tereza
Apresentação dos alunos
Dinâmica
Ivete
Lanche festivo
Alimentos - pedir doações
Tereza/Ivete/Rodrigo
1a. semana
Segunda, 12/08
Exibição de vídeo: Vida Maria
Vídeo, projetor
Rodrigo
Roda de conversa: debate sobre ideias principais do filme, com aprofundamento da apresentação dos alunos. Puxar expectativas do porque realizar este curso

Rodrigo e Ivete
Desenho coletivo
Papel kraft, tintas, canetas e lápis de cor, tesouras
Rodrigo e Ivete
Concluir aula com nova roda de conversa sobre a produção coletiva dos desenhos

Rodrigo e Ivete
Terça, 13/08
Acolhimento inicial: roda do sonho - pedir para alguém contar o sonho que teve

Rodrigo e/ou Ivete
Apresentação do computador: ensinar a ligar a máquina, seus componentes.
Máquinas em funcionamento
Paulinho e cia.
Exibição de vídeo sobre o computador
Vídeo será no próprio computador ou no datashow?

Cadastro do aluno no computador e preenchimento de ficha no papel
Ficha de matrícula

Quarta,
14/08
Dinâmica de acolhimento: saco de histórias
Um saco e objetos diversos

Círculo de cultura: avaliação inicial – conversar sobre história escolar dos alunos. O que aprenderam na escola? Escrever no papel o que eles já sabem fazer? Mostrar cartões de letras, apresentar palavras simples e ir aumentando a complexidade dependendo do que as pessoas mostrarem que sabem.
Letras e números em cartolinas – preparar
Preparar enquete no Google docs
(pedir pra Mariana)
Duas pessoas aplicam e duas registram
Quinta, 15/08
Dinâmica de acolhimento: telefone sem fio


Círculo de cultura: avaliação inicial – conversar sobre história escolar dos alunos. O que aprenderam na escola? Escrever no papel o que eles já sabem fazer. Mostrar cartões de letras, apresentar palavras simples e ir aumentando a complexidade dependendo do que as pessoas mostrarem que sabem.
Letras e números em cartolinas – preparar
Preparar enquete no Google docs
(pedir pra Mariana)
Duas pessoas aplicam e duas registram
Exercícios com o Paint – arrastar e clicar com o mouse


Rodrigo faz o registro das impressões durante esta semana
2a. semana
Segunda, 19/08
Dinâmica de acolhimento: jogo dos agrupamentos (chinelo/sapato, cor de roupa, time etc.)


Início da elaboração do crachá: identificação de cada nome em EVA, busca das letras em revistas.
Barbante, cartolinas, cola, revistas, tesouras
Levantamento dos materiais que existem - Rodrigo/Ivete
Terça, 20/08
Acolhimento: Alunos fazem a identificação do seu respectivo crachá para usar durante a aula e dizem, com uma palavra, como foi seu dia.


G1: Construção do ambiente alfabetizador com as palavras: mesa, janela, lixo, porta, quadro, teto, parede, livro, estante, mural (5 palavras para cada grupo): identificar nomes, compor em EVA e pedir que façam o exercício em duplas de fazer o crachá de cada objeto. 
Gravador (DMD - Luz do Oriente)

G2: Computador - exercícios do módulo "Começar"


Quarta, 21/08
Acolhimento: roda de contação de sonhos


G1: Menu "Começar" do computador


G1: roda de conversa para levantamento das palavras geradoras: a) o que você mais gosta na sua cidade? b) o que você não gosta em sua cidade? c) se pudesse mudar algo em sua cidade, o que mudaria? 



Acolhimento: dinâmica que Rodrigo e Ivete preferirem


Menu "Começar" do computador





Quinta, 22/08
Acolhimento: dinâmica que Rodrigo e Ivete preferirem


G1: Menu "Começar" do computador


G2: Desenho Miró


Momento coletivo: texto sobre Vida e roda para ver o que as pessoas entenderam deste texto.
Texto de Patativa do Assaré
Luana
Ivete faz o registro das impressões durante esta semana


Acordos iniciais com os alunos:

·         Não haverá mais lanchinho.
·         Não será possível levar criança pra aula.
·         Haverá chamada no fim de cada aula.
·         Teremos um total de 75 aulas. O aluno que tiver mais de 15 faltas não poderá receber certificado.
·         Haverá avaliações mensais, a serem preparadas pela equipe de planejamento pedagógico.

Para os monitores:

·         Preparar o mural de aniversariantes e de notícias culturais.
·         Fazer diariamente o registro das impressões sobre as aulas. Os dois monitores se revezarão nesta tarefa a cada semana.
·         Precisamos pensar nas aulas de matemática e preparar os materiais necessários para isso.


Integrantes das equipes

União do Vegetal
Coordenação do Departamento Nacional de Beneficência
Márcio Verbinski

Coordenação Nacional do Luz do Saber
Lauréti Lopes Mascarin

Casa da União
Pessoas diretamente relacionadas com este trabalho:
·         Angela Martins, Carlos Eduardo Cabral, Carla Franco, Tereza Moreira (entre 2009 – 2011)
·         Márcio Santiago, Tereza Moreira e William Vaz (entre 2012-2014)

Núcleo Luz do Oriente
José Araújo, João Marcelo Fernandes (entre 2009 – 2011)
Everaldo Azevedo e Sílvia Salim (entre 2012-2014)
Pessoas que se engajaram nas diversas fases:
Aldinéia Oliveira, Auricélio Timbó, Bruno Prieto, Clara Daré, Cláudia Fernandes, Ednaldo Azevedo, Erika Cortêz, Fábio Queiroz, Francisco Sérgio Nogueira, Izabel Alves, Jamila Terra, João Roberto Vieira, João Deusdeluz Alves, José Maria Alves, Luana Paz, Luiz Daré, Maria de Fátima Nobre, Maria Gorete Alves, Maria Ivete Queiroz, Mauro Batista, Pablo Alejandro, Paulo de Tarso Akel, Rafaela Fortes, Rodrigo Garcia, Tarcísio Rodopiano, Valdenira Lameiras, Vaneide Azevedo.

Núcleo Estrela Matutina
Ana Cristina Borges, Elza Lasse, Maria Paula Vasconcelos, Alexandre Goreti

Incentivos e apoios:
Cláudio Sarkis, Edison Saraiva, Francicarla, Viviane Mena Barreto, Maria Madalena (Cepafre), Carmem Palet, Tarcísio Barkhaus

Ninho dos Artistas
Ednaldo Azevedo
André Cavalcante

Texto: Tereza Moreira
Colaboração: Aldinéia Oliveira, Chico Nogueira, Luana Paz e Sílvia Salim
Projeto gráfico: Luiz Daré
Diagramação: Clara Daré
Fotos: Departamento de Memória e Documentação do Núcleo Luz do Oriente







[1] Software livre é um programa de computador que possui código aberto, ou seja, pode ser copiado, modificado, executado e redistribuído para outros usuários gratuitamente.
[2] Há um software especialmente desenvolvimento para trabalhar também com crianças, chamado Luz do Saber Infantil.
[3] Analfabetos funcionais são aquelas pessoas que, mesmo sendo capazes de ler textos curtos e reconhecer números, não desenvolvem habilidade para interpretar o que leem e de fazer operações matemáticas simples.
[4] Iniciativa do Departamento de Beneficência do CEBUDV criada – em âmbito nacional – com o intuito de atender a comunidades carentes durante um dia por ano. O Centro mobiliza voluntários de diversas áreas, bem como serviços públicos estaduais e municipais para prestar serviços gratuitos à comunidade.

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